“Lilian Tintori e sua filha entraram como hóspedes na residência de nossa missão diplomática em Caracas”, escreveu no Twitter Roberto Ampuero, chanceler do Chile. “Há alguns minutos se juntou a ela seu marido, Leopoldo López, que permanece lá junto à sua família. O Chile reafirma seu compromisso com os democratas venezuelanos”, concluiu.
Na manhã desta terça-feira, outro líder opositor venezuelano, Juan Guaidó, anunciou a “fase final” de sua tentativa de pôr fim ao governo do presidente Nicolás Maduro – e disse que tinha apoio militar para tanto.
Em um vídeo aparentemente gravado na base aérea La Carlota, em Caracas, e publicado nas redes sociais, Guaidó aparecia junto a homens de uniforme e de López.
Guaidó pede que os militares o ajudem a acabar com a “usurpação” do poder por Nicólas Maduro. “Nossas Forças Armadas, hoje valentes soldados, valentes patriotas, valentes homens apegados à constituição, acudiram nosso chamado, nos encontramos nas ruas da Venezuela”, disse Guaidó.
“Todos os venezuelanos que querem a liberdade devem vir para cá (a base aérea de La Carlota), interromper a ordem, se juntar a nós e encorajar nossos soldados a se unirem ao nosso povo. Bom dia, Venezuela, vamos fazer isso juntos”, falou Leopoldo López.
O governo de Maduro, por sua vez, chamou o episódio de “pequena tentativa de golpe”.
“Nervos de Aço! Conversei com os comandantes de todas as REDI e ZODI do país, que me manifestaram sua total lealdade ao povo, à Constituição e à Pátria. Convoco à máxima mobilização popular para assegurar a vitória da paz. Venceremos!”, escreveu Maduro no Twitter. REDI e ZODI são as siglas para Regiões de Defesa Integral e Zonas de Defesa Integral, respectivamente.
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O embaixador da Venezuela na ONU, Samuel Moncada, disse em pronunciamento que o governo democrático de Maduro derrotou uma nova tentativa de países estrangeiros de provocar conflitos no país.
Reação do governo Bolsonaro
Em resposta aos acontecimentos na Venezuela, o porta-voz da presidência brasileira, general Santana do Rêgo Barros, exortou “todos os países, identificados com os ideais de liberdade, para que se coloquem ao lado do Presidente Encarregado Juan Guaidó na busca de uma solução que ponha fim na ditadura de Maduro”, em nota enviada à imprensa no início da tarde desta terça-feira.
O porta-voz do governo brasileiro também afirmou que o país “acompanha com grande atenção a situação na Venezuela e reafirma o irrestrito apoio ao seu povo que luta bravamente por democracia”.
O porta-voz confirmou que o Brasil concedeu asilo a 25 militares venezuelanos, com patente entre tenente e soldado, que buscaram abrigo nesta terça-feira na embaixada brasileira em Caracas. Ele disse que, por questões sanitárias, está em avaliação a transferência do grupo para outro edifício do governo brasileiro na Venezuela.
“Já há 70 desertores militares venezuelanos em territórios brasileiros”, ressaltou.
O porta-voz disse que a comunicação com a Venezuela está muito difícil, mas, após algumas tentativas, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, conseguiu falar por telefone com Guaidó. Ele se recusou a detalhar o teor da conversa.
Mais cedo, Bolsonaro havia se manifestado pelo Twitter, reforçando seu apoio a Juan Guaidó: “O Brasil acompanha com bastante atenção a situação na Venezuela e reafirma o seu apoio na transição democrática que se processa no país vizinho. O Brasil está ao lado do povo da Venezuela, do presidente Juan Guaidó e da liberdade dos venezuelanos”.
Questionado se está totalmente descartada o uso de território brasileiro pelos Estados Unidos em caso de ação do governo americano contra a Venezuela, o porta-voz disse que “a probabilidade é muito pequena”. Pouco antes, Jair Bolsonaro disse em entrevista à TV Bandeirantes que “a possibilidade é próxima de zero, quase impossível”.
Já o vice-presidente, general Hamilton Mourão, disse para a BBC News Brasil que os oposicionistas Juan Guaidó e Leopoldo Lopez foram para o “tudo ou nada”. Acrescentou também que “não existe possibilidade” de ação militar do Brasil na Venezuela”.
Distúrbios e enfrentamentos em Caracas
Após o anúncio de Guaidó, passaram a ser registrados distúrbios e enfrentamentos entre forças de segurança e manifestantes em Caracas.
“Há barricadas, as pessoas estão bloqueando o tráfego. A polícia e a Guarda Nacional estão nas ruas e os partidários de Guaidó os desafiam”, disse o correspondente da BBC Mundo na capital venezuelana, Guillermo Olmo, nas primeiras horas desta terça-feira.
Segundo a agência de notícias AFP, as forças leais a Maduro utilizam gás lacrimogêneo para repelir os manifestantes, concentrados em frente à base aérea La Carlota.
Imagens exibidas pelo canal Globonews mostram várias pessoas lançando objetos contra tanques das forças de segurança, bem como o momento em que um desses veículos atropela parte dos manifestantes.
De que lado os militares têm estado até agora?

Os militares até agora vinham apoiando Maduro – e rechaçando o pleito de Guaidó por apoio para remover o governo.
Mas, no vídeo publicado em seu Twitter em 30 de abril, Guaidó diz que tem o apoio de “bravos soldados” em Caracas. Ele e militares fardados que o apoiam estão usando fitas e lenços azuis, tanto nos rostos quanto nos braços.
“Povo da Venezuela, vamos às ruas (…) para apoiar o fim da usurpação, que é irreversível. (…) As Forças Armadas Nacionais tomaram a decisão certa, elas têm o apoio do povo de Venezuela, e o apoio da nossa constituição. Elas vão estar do lado certo da história “, diz ele.
Guaidó é presidente da Assembleia Nacional, o Parlamento venezuelano e último órgão estatal sob controle da oposição. Em 23 de janeiro, se autoproclamou presidente interino da Venezuela.
Poucas semanas antes, Maduro havia tomado posse de um segundo mandato presidencial. Mas a oposição, que não quis participar das eleições em maio do ano passado, não reconheceu o chavista como presidente legítimo, alegando que as votações não foram reconhecidas pelos Estados Unidos, pela União Europeia e por muitos outros países.


Também no vídeo divulgado nas redes sociais nesta terça-feira, oposicionista Leopoldo López disse que foi libertado por militares que declararam lealdade a Guaidó.


Em resposta ao caso, o ministro da Informação venezuelano, Jorge Rodríguez, postou no Twitter que o governo estava enfrentando um pequeno grupo de “traidores militares” que, segundo ele, estavam tentando promover um golpe.


Imagens feitas posteriormente pela agência de notícias Reuters mostram Guaidó e López com dezenas de homens uniformizados em uma rodovia em Caracas. Muitos estavam usando braçadeiras azuis sinalizando apoio a Guaidó. A filmagem mostra ainda gás lacrimogêneo sendo disparado contra eles e contra apoiadores.
A agência de notícias Reuters informou ter havido tiros na base militar La Carlota e num comício liderado por Guaidó do lado de fora da base aérea, onde se concentra o grupo contrário a Maduro.

Apostas
Não se sabe se a liberação de Leopoldo López, tradicional líder antichavista que desafiou Maduro em 2014, é apenas mais uma das muitas ofensivas da oposição contra Maduro.
Como o presidente venezuelano continua no poder, muitos analistas chegaram a acreditar que o chamado “efeito Guaidó” poderia diluir.
E foi exatamente quando muitos pensavam que o projeto encabeçado por Juan Guaidó para tirar Nicolás Maduro do poder da Venezuela estava prestes a fracassar, o líder oposicionista fez um movimento inesperado e de impacto.
Este último e inesperado passo vem num momento em que protestos recorrentemente convocados pelo líder da oposição, que em 23 de janeiro invocou a Constituição e se declarou presidente interino do país, pareciam estar enfraquecendo.
No entanto, segundo o correspondente da BBC News Mundo em Caracas, Guillermo D. Olmo, a “situação é muito incerta”. “Mas Guaidó conseguiu apresentar fatos de algo que anunciava há semanas, que ‘a cadeia de comando na Venezuela foi quebrada'”, observa.
Reações
O senador americano Marco Rubio, defensor ferrenho de Guaidó, recorreu ao Twitter para pedir aos militares que apoiem o presidente da Assembleia Nacional.
O Secretário de Estado do país, Mike Pompeo, postou no Twitter que o presidente interino Guaidó anunciou o começo da chamada “Operação Liberdade” e afirmou que os EUA “apoiam o povo da Venezuela na sua busca pela liberdade e democracia”. “A democracia não pode ser derrotada”, escreveu.


O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, demonstrou suporte a Guaidó. No Twitter, ele escreveu que “saúda a adesão dos militares a Constituição e ao presidente encarregado da Venezuela”.
“É necessário o mais pleno apoio ao processo de transição democrática de forma pacífica”, postou Almagro.


Também no Twitter, Vladimir Padrino, atual ministro da Defesa da Venezuela, disse que as Forças Armadas estão permanecendo leais a Maduro. Ele também critica os “covardes” e “traidores” que estariam por trás do que chama de “golpe”.
“As Forças Armadas permanecem firmes na defesa da Constituição nacional e das autoridades legítimas. Todas as unidades militares empregadas nas oito regiões de defesa reportaram que as coisas estão normais nos quarteis e nas bases militares, que estão sob o comando de seus comandantes locais.”
Padrino diz que rejeita o “movimento de golpe” e chama os envolvidos na ação de “pseudolíderes”.
Nas redes sociais, os líderes da América Latina se dividiram quanto ao movimento de Guaidó e López.
O presidente da Bolívia, Evo Morales, condenou “energeticamente” o que considera como “tentativa de golpe de Estado” por parte de uma “direita que é submissa a interesses estrangeiros”. Morales também disse ter certeza que a Revolução Bolivariana se imporá a “esse novo ataque do império”.
O líder boliviano culpou os Estados Unidos por “promover golpes de Estado”, na busca de “provocar violência e morte” no país.

Na mesma linha, o ministro das Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodríguez, disse que condena “o golpe de Estado em andamento” e afirmou que Cuba oferece apoio e lealdade a Nicolás Maduro, “o presidente constitucional de nossa nação irmã e ao seu governo chavista e bolivariano”.
O Grupo de Lima, , fórum de articulação política criado para acompanhar a situação da Venezuela que reúne representantes de 14 países, declarou estar em “sessão permanente” e vai se reunir de maneira presencial no próximo dia 3 de maio em Lima, no Peru.
O grupo foi criado em 2017, na capital do Peru, reunindo ministros das relações exteriores para buscar formas de contribuir com a estabilização da crise na Venezuela. Entre eles, Peru, Brasil, Colômbia, Argentina, México e Canadá.
O presidente da Colômbia, Iván Duque, convocou o povo e os militares venezuelanos a ficar “do lado certo da história”, rechaçando “a ditadura e a usurpação de Maduro”.
Seguindo uma terceira via, o governo espanhol defendeu em sua conta no Twitter a realização imediata de eleições para que um novo presidente seja escolhido. “O governo da Espanha deseja que não se produza um derramamento de sangue na Venezuela e reitera seu apoio a um processo democrático pacífico no país”, diz a mensagem.
‘Transição democrática’
No Brasil, uma reunião foi convocada no Palácio do Planalto para discutir o assunto, segundo o vice-presidente, general Hamilton Mourão. Além do presidente Jair Bolsonaro e do vice, estava prevista a participação dos ministros Fernando Azevedo e Silva (Defesa), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores).

Araújo, falou sobre a situação da Venezuela na manhã desta terça-feira, em coletiva no Palácio do Itamaraty. O ministro disse que o Brasil tem compromisso com a democracia e apoia o que chamou de processo de transição democrática e o presidente autoproclamado Juan Guaidó.
O ministro, no entanto, ressaltou que é preciso reunir mais informações para ter “dimensão do que está ocorrendo”. Disse ainda que é positivo “o movimento dos militares que reconhecem a constitucionalidade do presidente Juan Guaidó”.
Araújo acrescentou que a expectativa é que todas as “forças venezuelanas atendem a esse chamado pela democracia”. “O Brasil, como sempre, desde o começo, apoia o processo de transição democrática”, afirmou. Com informações da BBC.